quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Estereótipos da mídia: quem sabe um dia vivermos sem eles



Há muitas décadas que a cobertura jornalística que a televisão dá a estilos musicais e seus seguidores é caracterizada por duas infelizes frentes: a superficialidade e o estereótipo. Recentemente o programa “A Liga”, da TV Bandeirantes, exibiu uma matéria onde cobria quatro diferentes segmentos do universo musical brasileiro e focou a linha editorial em seus universos mais superficiais – as letras pornográficas do funk, a bebedeira e pegação do sertanejo (universitário – arrocha, etc), a simplicidade marginal do rap e a agressividade dos shows de rock (ali representado por uma banda metalcore).

Não entrando no mérito de funk, rap e sertanejo (segmentos aos quais não sou sequer simpático, por isso desconheço os detalhes de sua cultura), os atos apresentados para os consumidores de rock comprovaram infelizmente o que eu previa antes de assistir a tal programa: uma visão popularesca e por vezes enfatizando e pressupondo comportamentos bizarros. Vamos aos fatos dissecados. Sempre aquela mesma coisa de padronizar fãs de rock e metal como se TODOS usassem piercings, tatuagens e trajes de cor preta, como se isso fosse obrigação ou qualificação para uma pessoa ser mais ou menos culta no estilo. No festival onde a matéria foi feita, a banda em destaque era a Project 46. Na passagem do som o apresentador Thaíde apenas mostrou a faceta gutural do desempenho do vocalista. E no show apenas a “roda de agito” que os fãs fazem no meio do público. Sequer mostrou o nome de uma música, sequer questionou os membros sobre suas influências, ou mesmo como foi a experiência de ter se apresentado no festival “Monsters of Rock”.

Chegará um dia em que eu verei uma cobertura jornalística a cerca de rock, que enfatize sua complexa conjuntura de fatores para levar a cabo sua execução: muito estudo, bons equipamentos, conhecimentos de arranjos, efeitos, amplificação, ensaios feitos até a exaustão, e sua sobrevivência no mercado underground do showbizz, vivendo fora da mídia mercadológica (aqui não me refiro ao happy-rock de MTV de nomes como Fresno, CPM22, etc). Num campo agora confessamente comparativo, tem as dificuldades que outros estilos não têm e ao mesmo tempo carrega consigo um universo técnico muito mais elaborado e que exige muito mais educação musical e dedicação dos instrumentistas envolvidos que outros tipos de música.

Além do item superficialidade, a aplicação dos estereótipos baratos chega a ser irritante.

Quem disse que todo show de rock/metal é a mesma coisa? Quem disse que todo fã do estilo se comporta, se veste, enxerga e consome a música do mesmo jeito? Saindo da aura do rock, prefiro acreditar que existam também outros consumidores de funk ou sertanejo que também frequentem shows desse tipo que não estão ali apenas para beijar 30 pessoas, mostrar as suas partes íntimas em público ou cair de tanta bebida consumida. O que sugiro refletir neste artigo não é exatamente a preferência musical, mas a maneira com a mídia utiliza-se de intenções popularescas com o suposto intuito de mostrar o universo que envolve cada segmento. Mas talvez essa seja a ideia, afinal porque mostrar uma faceta cultural ao povo, quando se pode abusar de bizarrices e fatos degradantes, pois num país onde reality shows, novelas e programas de auditório são “mais interessantes” do que discutir e conhecer problemas sociais e políticos, programas popularescos serão sempre a estratégia comercial favorita da grande mídia.

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

O mundo do rock ainda precisa do Black Sabbath


Começo apregoando contra o sentido saudosista do título acima. Afinal música é eterna. Mesmo que músicos morram, que bandas se aposentem, sua obra ficará pra sempre e sempre será ouvida e resgatada por todas as gerações vindouras. Se, claro, ela tiver conteúdo e relevância. Os Beatles lançaram o último disco em 1970 (há 43 anos), Led Zeppelin em 1980, Hendrix em 1970, Cream em 1969. E todos eles ainda ecoam e povoam aparelhos e ouvidos de muito apreciador de música, desde um teenager até um sócio da terceira idade.

Muita gente costuma insistir que, da década de 1990 pra cá nada se produziu de qualidade em termos de rock. Invariavelmente, são pessoas que focam seus gostos e interesses nas músicas de décadas anteriores a esta. À luz da minha humilde análise, música boa não tem época. Pode ter sido criada 50 anos atrás ou na semana passada. Evidentemente, no mundo do rock, alguns artistas são seminais, forjaram padrões de arranjos, harmonias e produção, no que se convencionada chamar-se de “estilo”. Mas não nos esquecemos de que o próprio Led Zeppelin quando surgiu foi taxado de plagiador, por se utilizar de linhas anteriormente concebidas de blues em cima delas criar novas tendências de efeitos e melodias. Então, música é transformação. Se você gosta de algo novo, que te traga prazer e diversão, não tem problema. Música é pra isso mesmo. Pelé não joga mais, mas ainda podemos ter momentos de regozijo futebolísticos com Neymares e Messis de hoje em dia, num ensaio metafórico.

Então porque abrir este texto com tal título “O mundo do rock ainda precisa do Black Sabbath”? Simples. O Sabbath, na visão acho que da maioria, criou o heavy metal. Lançou discos brilhantes e fez shows poderosos nos anos 1970. E depois dele, muita coisa se desenvolveu e se expandiu no mundo da música. Mas, em 2013, eis que 3/4 da banda originou concebeu “13”, um disco de estúdio com faixas inéditas. E o resultado mostrou que a banda soube explorar o máximo da tecnologia de produção contemporânea para mostrar ao mundo do rock que ainda tem poder de fogo em termos de composição. Então o universo do rock dos dias de hoje pode entender que talento não tem idade. É uma amostra analógica de que o rock é eternamente jovem, e é concebido na junção atmosférica dos elementos energia, alegria e melodia. Seja de Chuck Berry, seja do ultra-hiper-pesado-death-grind-noise, seja do viajante-alucinógino-progessivo, seja do alegre-hair-happy-colorido-rock.

Além disso, o Sabbath começou uma (que pode ser a última) turnê de sua vida. O Ozzy não é mais o mesmo, não tem mais aquela disposição? Claro que não. Tem 64 anos e uma vida de excessos que o tempo não tarda em cobrar. Mas e daí? As performances estão longe de serem constrangedoras ou degradantes. Além disso tudo, essa história toda de disco novo e turnê da formação (quase) original dá ao rock e ao metal uma exposição significante no mundo do showbizz musical. Quantos novos garotos não vão conhecer e talvez se interessar por esses velhinhos e sua música pesada. E, até onde a idade permitir, porque não pensar na maravilhosa ideia de uma coexistência de artistas sessentões (setentões, certo Macca e Jagger?) a nomes não tão experientes mas ainda históricos (a turma dos 80) e às bandas surgidas nas últimas décadas?

O mundo do rock precisa do Sabbath para evidenciar e relembrar sua história. Assim como precisa do Floyd, AC/DC, Purple, Who, Queen e uma infinidade de monstros sagrados. Estejam eles compondo coisas novas e tocando por aí ou não. Mas, não exijamos muito de nosso raciocínio: velho ou novo, só estará em evidência se existir alguma novidade acerca de sua obra. Não necessariamente uma turnê, como provou o “Celebration Day” do Led.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

10 Motivos que Transformam o Rock in Rio 2013 num Evento Satisfatório

O nome “Rock” consta no batismo do evento, que aconteceu no Brasil pela primeira vez em 1985. Por isso existe muita indignação dos fãs de rock pela presença de artistas de outros estilos em alguns dias do festival. Mas esqueçamos os interesses de mídia, gravadoras, etc. Afinal, pra quem anuncia (investe milhões em publicidade) tem muito interesse em ter artistas populares no evento.

1)      Dos três grandes shows de headliners TODOS eram de rock: Metallica, Bruce Springsteen e Iron Maiden

2)      Dos headliners comentados, dois eram de heavy metal, um estilo que mais sofre ojeriza e rejeição, mesmo dentro de consumidores do mercado rock em geral.

3)      O Metallica, que já havia brilhado em 2011 (na edição desse mesmo evento) é essencialmente uma banda de thrash metal (foi o que constou no último disco da banda, “Death Magnetic”), um dos estilos mais agressivos de rock. Mesmo que tenha caído nas graças do mundo da música popular com o disco “Metallica”, de 1991, a aura de seu show é de músicas rápidas e pesadas. E ainda tivemos a deliciosa agressão sonora do Slayer no Palco Mundo. Jamais os conhecedores da música pesada imaginariam tal atração em frente a 80 mil pessoas num festival deste tipo.

4)      O Iron Maiden brilhou como sempre, em sua terceira aparição neste festival. Uma das bandas mais adoradas no Brasil. Com um show especial (turnê de 25 anos do disco “Seventh Son of a Seventh Son”).

5)      Show de nomes como Alice in Chains, Bon Jovi, Muse e Robie Zombie, por mais que dividam opiniões, agradaram suas plateias e fizeram shows com muita energia. Novidades como Philips Philips e Ben Harper, fizeram shows tecnicamente irrepreensíveis.

6)      O palco Sunset, muito criticado pela estrutura na edição anterior, esse ano foi essencial e apresentou shows memoráveis. Sepultura é uma banda que divide opiniões, os antigos acham que estão perdidos e forçados, os mais novos acharam interessante essa parceria com nomes como Zé Ramalho. Mas, mesmo repetindo uma fórmula já explorada na última edição (Tambours Du Bronx), trouxe as tradicionais performances competentes e fez a alegria da massa headbanger.

7)      Nunca se imaginaria que bandas como Slayer, Helloween, Destruction, Sebastian Bach, Offspring tocariam algum dia num evento de apelo popular como o Rock in Rio.

8)      Bandas nacionais, sempre relegadas ao circuito undeground em que pese sua história, competência e criação musical, tiveram sua chance. Nomes como Almah, Hibria, Viper, André Matos, Krisiun e Dr. Sin fizeram set excelentes (alguns tiveram performances espetaculares). Em outros tempos quem ocuparia este espaço seriam bandas de emocore, pop-rock ou hardcore melódico. Não esqueçamos que nomes fortes de TV e mídia como Cachorro Grande, Restart, CPM22, Fresno, Los Hermanos, Pitty, O Rappa, Raimundos, RPM são muito mais conhecidos na mídia e foram preteridos por bandas de hard e metal. Isso, a meu ver, é uma amostra da força que estes estilos têm entre os consumidores de rock. E quem atua na mídia de show business deve ter percebido isso (o público do Sunset do domingo foi o maior do festival).

9)      Claro que todo fã de rock teria uma sugestão diferente de cast, para qualquer dia. Muitos se incomodam com presença de nomes como Ivete Sangalo ou Beyonce. Mas, como eu falei em alguns comentários anteriores, pensemos que o festival tivesse outro nome, “Rio Music Festival”, por exemplo, que traz durante três ou quatro dias grandes shows de rock. E hoje, com a presença de canais fechados de TV, em quase toda residência, temos a chance de assistir o festival praticamente na íntegra, pra quem não teve a chance de estar lá presente. Se não existisse o Rock in Rio, mesmo com artistas de outros estilos em sua escalação, grandes de bandas de rock não estariam sendo comentadas ou expostas. Mais de uma dezena de bons e memoráveis shows numa só semana.


10)   Não se sabe que, daqui a 15 anos, quando não mais estiverem em atividade nomes como McCartney, AC/DC, U2, Kiss, Van Halen, Maiden, Metallica, Stones, Guns N’Roses, Rush e outros (nomes que lotam estádios sozinhos e sempre serão headliners), quais serão os grandes artistas cotados a fechar megaeventos como o Rock in Rio. Mas isso será futuro, por hoje vimos alguns destes nomes fazerem shows no ápice de suas formas, sem soar caóticos ou cheirando naftalina decadente.